Cerca de 50 agricultores e jovens estudantes dos assentamentos Nova Esperança, em Olho D’Água do Casado, e Lameirão, em Delmiro Gouveia, receberam uma capacitação técnica focada no conceito de paisagens alimentares e turismo sustentável de base comunitária. As atividades ocorreram de 29 a 31 de janeiro, no campus de Piranhas do Instituto Federal de Alagoas, o Ifal, e integram o projeto Paisagens Alimentares, coordenado pela Embrapa Alimentos e Territórios. As paisagens alimentares representam a possibilidade de se intervir num território com o propósito de promover o desenvolvimento territorial sustentável, olhando, particularmente, para o sistema alimentar, aponta o especialista Francisco Sarmento, da Agrosuisse, que assessora a equipe técnica da Embrapa no projeto. O intuito é que o turismo permita também o desenvolvimento de um sistema alimentar mais inclusivo, no sentido de envolver as pessoas que, normalmente, estão em situação de maior vulnerabilidade, como os agricultores familiares. O conceito é relativamente recente, mas não é a única estratégia, conforme o especialista, o qual apoia a criação de redes nacional e internacional de paisagens alimentares. Ele explica que alguns países já estão implementando as suas paisagens, como é o caso, na Europa, de Portugal, Espanha e França; e, no continente africano, de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe; além da Bolívia, na América do Sul. “No Brasil estamos começando pioneiramente com a Embrapa. Então, na realidade, é um caminho que a gente está construindo”, afirma. O líder da iniciativa, Aluísio Goulart, conta que a capacitação inicia a terceira fase do projeto, que contempla uma etapa de compartilhamento das informações levantadas pela equipe junto a esses grupos em 2023. A ideia é que eles possam melhorar o seu conhecimento acerca do desenvolvimento dos produtos turísticos associado ao desenvolvimento do território, sob a ótica da multifuncionalidade da agricultura. Para ele, o conceito de paisagens alimentares engloba essa visão na qual tudo que é produzido no território esteja conectado com o interesse do turista em conhecer experiências autênticas, sobretudo do ponto de vista da cultura alimentar. Meio ambiente, patrimônio e gestão de negócios “Nessa etapa, nós estamos trazendo, com a parceria da Ufal, temáticas relacionadas à gestão do negócio turístico, à precificação de produtos turísticos e também temáticas que a própria Embrapa trabalha, voltadas à questão da sustentabilidade no turismo e ao patrimônio imaterial que está vinculado a esse território, em especial aqui em Olho D’Água do Casado, região onde há vários sítios arqueológicos”, informa Goulart. Durante a capacitação, Patrícia Bustamante, pesquisadora da Embrapa, falou sobre os impactos das mudanças climáticas e discutiu em conjunto com os participantes as medidas de mitigação e adaptação. Outro tema debatido foi a valorização dos sistemas agrícolas considerados patrimônio cultural, pelo papel que eles desempenham na preservação do meio ambiente e das práticas e conhecimentos tradicionais. Os professores da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Carlos Costa e Valdemir da Silva e a monitora Lívia Maria Alves Santos também participaram das capacitações e falaram sobre gestão de negócios, cooperativismo e associativismo, e precificação de produtos turísticos. “Nossa intenção foi, especificamente, apresentar aos agricultores as perspectivas tanto do ambiente interno, o ambiente da cooperativa, que envolve o funcionamento, recursos, atividades, organização interna, processos, e ao mesmo tempo apresentar o ambiente externo”, explica Costa. Nesse paralelo entre o ambiente interno e externo, nos quais há vários atores, como os turistas e os clientes, por exemplo, a equipe trabalhou com uma noção do campo a partir do que os agricultores desenvolvem. “Não adianta eles fortalecerem apenas internamente a organização, se eles não olharem para o ambiente externo, e também não adianta querer abraçar todos os turistas, todos os visitantes, sem reconhecer que é preciso organizar-se internamente para fazer isso”, ressalta o professor. Para Costa, estimular a participação e o envolvimento das comunidades é uma ação muito especial. “O grande desafio para a universidade é você conseguir chegar em determinados contextos e não necessariamente impor uma regra ou uma ferramenta, no nosso caso, de administração, gestão ou contabilidade. Mas entender a partir da linguagem deles, a perspectiva deles, as visões de mundo e como a realidade deles tem sido construída”, pontua. Além disso, o professor observa que as discussões permitem que os agricultores possam entender que a atividade que eles desenvolvem está vinculada, por exemplo, a uma agenda mundial como a dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, os ODS. “Principalmente pelo arcabouço que vocês da Embrapa trazem, das paisagens alimentares, as discussões permitem que eles façam uma conexão com o que está acontecendo globalmente ou localmente”, destaca. Costa aponta ainda o envolvimento dos jovens, fundamental para que as ações tenham continuidade. Impactos sociais Na visão de Aline Oliveira da Silva (ao centro), mestre em história e moradora do Assentamento Lameirão, as capacitações já vem produzindo impactos na vida dos agricultores e no empoderamento das mulheres das comunidades. “Pensando no nome paisagem alimentar, uma palavra que o Sarmento usou e que achei muito bonita é que nós somos os ‘jardineiros’ dessas paisagens”, conta. “Nós já observamos agora um valor a mais, um sentimento naquela produção, naquela planta, que já vem do saber histórico, mas agora, com essas capacitações, reafirma ainda mais o patrimônio que somos nós e também a natureza na construção dessa paisagem”, enfatiza Aline Silva. “O projeto Paisagens Alimentares, sobretudo na nossa região do sertão do São Francisco, aqui em Alagoas, ajuda a descortinar muitos preconceitos estabelecidos que se tinha sobre a região, que era uma região seca, que não se tinha alimentos e que a gente só observava a partir de um rótulo da seca. As paisagens alimentares reafirmam a luta histórica desse povo, desses sujeitos agricultores, na construção de uma paisagem que tem alimento, que tem soberania territorial, que tem agroecologia, que cuida da biodiversidade, com a biodiversidade pensando a vida como um todo. Então, o projeto ratifica essa função social da terra e, mais do que tudo isso, reafirma a importância do agricultor lá na terra, arando, cuidando e produzindo biodiversidade”, observa. Para o seu Agaiton Alves de Souza, da Associação Pegadas da Caatinga, no Assentamento Nova Esperança, a experiência foi gratificante, pois houve muito aprendizado nesse treinamento. Já Maria Rosário Anjos Vieira, do mesmo assentamento, acredita que a capacitação ajuda as pessoas das comunidades a se unirem, trabalhando juntas para que possam avançar e superar os seus desafios. Elisângela Anjos Vieira também aposta que o compartilhamento de conhecimento vai ajudar bastante a comunidade a melhorar sua organização e a alcançar seus objetivos. O secretário de Cultura e Turismo de Piranhas, Eduardo Clemente, presidente da Instância de Governança dos Cânions do São Francisco, destaca a importância do turismo de base comunitária. “Pra gente aqui do sertão, o nosso maior tesouro é o desenvolvimento sustentável. Nós temos um potencial imenso com nossas belezas naturais, com nossos produtos turísticos, e isso tudo tem e deve estar aliado à sustentabilidade, à preservação”, avalia. Ele também reforça a necessidade de mostrar, principalmente para a nova geração, que a preservação é essencial ao desenvolvimento turístico da região.
Foto: Nadir Rodrigues
Capacitação aborda meio ambiente, patrimônio cultural, gestão de negócios, cooperativismo e associativismo, e precificação de produtos turísticos
Cerca de 50 agricultores e jovens estudantes dos assentamentos Nova Esperança, em Olho D’Água do Casado, e Lameirão, em Delmiro Gouveia, receberam uma capacitação técnica focada no conceito de paisagens alimentares e turismo sustentável de base comunitária. As atividades ocorreram de 29 a 31 de janeiro, no campus de Piranhas do Instituto Federal de Alagoas, o Ifal, e integram o projeto Paisagens Alimentares, coordenado pela Embrapa Alimentos e Territórios.
As paisagens alimentares representam a possibilidade de se intervir num território com o propósito de promover o desenvolvimento territorial sustentável, olhando, particularmente, para o sistema alimentar, aponta o especialista Francisco Sarmento, da Agrosuisse, que assessora a equipe técnica da Embrapa no projeto. O intuito é que o turismo permita também o desenvolvimento de um sistema alimentar mais inclusivo, no sentido de envolver as pessoas que, normalmente, estão em situação de maior vulnerabilidade, como os agricultores familiares.
O conceito é relativamente recente, mas não é a única estratégia, conforme o especialista, o qual apoia a criação de redes nacional e internacional de paisagens alimentares. Ele explica que alguns países já estão implementando as suas paisagens, como é o caso, na Europa, de Portugal, Espanha e França; e, no continente africano, de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe; além da Bolívia, na América do Sul. “No Brasil estamos começando pioneiramente com a Embrapa. Então, na realidade, é um caminho que a gente está construindo”, afirma.
O líder da iniciativa, Aluísio Goulart, conta que a capacitação inicia a terceira fase do projeto, que contempla uma etapa de compartilhamento das informações levantadas pela equipe junto a esses grupos em 2023. A ideia é que eles possam melhorar o seu conhecimento acerca do desenvolvimento dos produtos turísticos associado ao desenvolvimento do território, sob a ótica da multifuncionalidade da agricultura. Para ele, o conceito de paisagens alimentares engloba essa visão na qual tudo que é produzido no território esteja conectado com o interesse do turista em conhecer experiências autênticas, sobretudo do ponto de vista da cultura alimentar.
Meio ambiente, patrimônio e gestão de negócios
“Nessa etapa, nós estamos trazendo, com a parceria da Ufal, temáticas relacionadas à gestão do negócio turístico, à precificação de produtos turísticos e também temáticas que a própria Embrapa trabalha, voltadas à questão da sustentabilidade no turismo e ao patrimônio imaterial que está vinculado a esse território, em especial aqui em Olho D’Água do Casado, região onde há vários sítios arqueológicos”, informa Goulart.
Durante a capacitação, Patrícia Bustamante, pesquisadora da Embrapa, falou sobre os impactos das mudanças climáticas e discutiu em conjunto com os participantes as medidas de mitigação e adaptação. Outro tema debatido foi a valorização dos sistemas agrícolas considerados patrimônio cultural, pelo papel que eles desempenham na preservação do meio ambiente e das práticas e conhecimentos tradicionais.
Os professores da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Carlos Costa e Valdemir da Silva e a monitora Lívia Maria Alves Santos também participaram das capacitações e falaram sobre gestão de negócios, cooperativismo e associativismo, e precificação de produtos turísticos. “Nossa intenção foi, especificamente, apresentar aos agricultores as perspectivas tanto do ambiente interno, o ambiente da cooperativa, que envolve o funcionamento, recursos, atividades, organização interna, processos, e ao mesmo tempo apresentar o ambiente externo”, explica Costa.
Nesse paralelo entre o ambiente interno e externo, nos quais há vários atores, como os turistas e os clientes, por exemplo, a equipe trabalhou com uma noção do campo a partir do que os agricultores desenvolvem. “Não adianta eles fortalecerem apenas internamente a organização, se eles não olharem para o ambiente externo, e também não adianta querer abraçar todos os turistas, todos os visitantes, sem reconhecer que é preciso organizar-se internamente para fazer isso”, ressalta o professor.
Para Costa, estimular a participação e o envolvimento das comunidades é uma ação muito especial. “O grande desafio para a universidade é você conseguir chegar em determinados contextos e não necessariamente impor uma regra ou uma ferramenta, no nosso caso, de administração, gestão ou contabilidade. Mas entender a partir da linguagem deles, a perspectiva deles, as visões de mundo e como a realidade deles tem sido construída”, pontua.
Além disso, o professor observa que as discussões permitem que os agricultores possam entender que a atividade que eles desenvolvem está vinculada, por exemplo, a uma agenda mundial como a dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, os ODS. “Principalmente pelo arcabouço que vocês da Embrapa trazem, das paisagens alimentares, as discussões permitem que eles façam uma conexão com o que está acontecendo globalmente ou localmente”, destaca. Costa aponta ainda o envolvimento dos jovens, fundamental para que as ações tenham continuidade.
Impactos sociais
Na visão de Aline Oliveira da Silva (ao centro), mestre em história e moradora do Assentamento Lameirão, as capacitações já vem produzindo impactos na vida dos agricultores e no empoderamento das mulheres das comunidades. “Pensando no nome paisagem alimentar, uma palavra que o Sarmento usou e que achei muito bonita é que nós somos os ‘jardineiros’ dessas paisagens”, conta. “Nós já observamos agora um valor a mais, um sentimento naquela produção, naquela planta, que já vem do saber histórico, mas agora, com essas capacitações, reafirma ainda mais o patrimônio que somos nós e também a natureza na construção dessa paisagem”, enfatiza Aline Silva.
“O projeto Paisagens Alimentares, sobretudo na nossa região do sertão do São Francisco, aqui em Alagoas, ajuda a descortinar muitos preconceitos estabelecidos que se tinha sobre a região, que era uma região seca, que não se tinha alimentos e que a gente só observava a partir de um rótulo da seca. As paisagens alimentares reafirmam a luta histórica desse povo, desses sujeitos agricultores, na construção de uma paisagem que tem alimento, que tem soberania territorial, que tem agroecologia, que cuida da biodiversidade, com a biodiversidade pensando a vida como um todo. Então, o projeto ratifica essa função social da terra e, mais do que tudo isso, reafirma a importância do agricultor lá na terra, arando, cuidando e produzindo biodiversidade”, observa.
Para o seu Agaiton Alves de Souza, da Associação Pegadas da Caatinga, no Assentamento Nova Esperança, a experiência foi gratificante, pois houve muito aprendizado nesse treinamento. Já Maria Rosário Anjos Vieira, do mesmo assentamento, acredita que a capacitação ajuda as pessoas das comunidades a se unirem, trabalhando juntas para que possam avançar e superar os seus desafios. Elisângela Anjos Vieira também aposta que o compartilhamento de conhecimento vai ajudar bastante a comunidade a melhorar sua organização e a alcançar seus objetivos.
O secretário de Cultura e Turismo de Piranhas, Eduardo Clemente, presidente da Instância de Governança dos Cânions do São Francisco, destaca a importância do turismo de base comunitária. “Pra gente aqui do sertão, o nosso maior tesouro é o desenvolvimento sustentável. Nós temos um potencial imenso com nossas belezas naturais, com nossos produtos turísticos, e isso tudo tem e deve estar aliado à sustentabilidade, à preservação”, avalia. Ele também reforça a necessidade de mostrar, principalmente para a nova geração, que a preservação é essencial ao desenvolvimento turístico da região.
Nadir Rodrigues (MTb 26.948/SP)
Embrapa Alimentos e Territórios
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