Onze anos separam a primeira da segunda edição do Congresso Brasileiro de Macaúba. À época da primeira, 2013, os pesquisadores precisavam explicar: é uma palmeira nativa do Brasil, encontrada em quase todo o território, tem um fruto com uma polpa amarela ou alaranjada e uma castanha, ambas comestíveis. Tanto a polpa quanto a castanha geram óleos em quantidade semelhante ou superior à da palma-de-óleo, que podem ser usados para fazer muitas coisas, de xampu a combustível de avião. Na nova edição do evento científico, realizado na semana passada, em Campinas, SP, o auditório do Instituto Agronômico (IAC) ficou lotado de pessoas para as quais já não era preciso explicar nada disso. De estudantes a empresários, o público já conhecia a planta e seu potencial. Buscava ali os avanços das pesquisas para a exploração comercial e oportunidades de negócios. “Há 11 anos, tínhamos que mostrar uma foto, falar com detalhes. Hoje, não. Hoje, o nome macaúba já abre portas”, diz a pesquisadora Simone Palma Favaro, da Embrapa Agroenergia, uma das organizadoras do congresso. Nesse período, o número de artigos científicos sobre a cultura foi multiplicado por quatro. Também cresceram os depósitos de patentes de tecnologias relacionadas à cultura – e eles se concentram no Brasil. O coordenador do Congresso, o pesquisador do IAC Carlos Augusto Colombo, avalia que as instituições públicas de pesquisa foram as primeiras a acreditar na macaúba. Com os resultados do trabalho delas, o setor privado começou a se interessar. Em sintonia com o colega, Simone Favaro lembra que, quando aconteceu o primeiro congresso, havia apenas duas empresas começando a investir na cultura, mas ainda sem nenhum plantio comercial. Hoje, são quatro companhias e as plantações estão chegando a 10 mil hectares. Óleo para a Bioeconomia Além dos resultados alcançados pelas pesquisas, o estímulo vem do mercado, particularmente dos compromissos firmados por nações e segmentos econômicos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Renato Roscoe, diretor do Instituto Taquari Vivo, destacou: “198 países concordam que as mudanças climáticas estão aí e algo precisa ser feito”. Diminuir o lançamento de GEEs na atmosfera é uma das principais metas, o que pressiona principalmente o setor de energia. Ele é responsável por 73% das emissões globais e a demanda só cresce. Substituir fontes fósseis por matérias-primas renováveis é uma das principais estratégias e é aí que entra a macaúba, com sua alta produtividade de óleos e biomassa. Entre uma infinidade de produtos, há expectativa de que o óleo de macaúba sirva de insumo para a produção de combustível sustentável de aviação, cuja demanda está estimada em 450 bilhões de litros em 2050. Diferente do que ocorre nos automóveis, não há previsão de eletrificação dos aviões, que continuarão utilizando combustíveis líquidos, assim como os navios. O pesquisador Maurício Antônio Lopes, da Embrapa Agroenergia, ressalta que a descarbonização, com o uso de matérias-primas renováveis, é meta também de vários outros segmentos industriais, como o da química e o de materiais. Com isso, a demanda por óleos, já crescente e com reflexo nos preços, deve aumentar. “Óleos vegetais vão se tornar elemento crítico nessa nova economia que está surgindo”, analisa. Para Lopes, “a macaúba poderá se tornar uma nova soja no Brasil”. Cenário promissor A palmeira está em processo de domesticação: ainda não há variedades que passaram por melhoramento genético e, apesar dos avanços, seguem em aberto questões como o ponto e forma de colheita. Mas, com três mapas na tela, Lopes mostra que, nos anos 1960, o cultivo de soja estava praticamente restrito a uma pequena mancha no Sul do País; com o desenvolvimento tecnológico, em 1999, já estava presente nas cinco regiões e, hoje, responde por pelo menos 25% do valor bruto da produção agropecuária nacional. Também com três mapas, Simone Favaro mostra uma das razões pelas quais, no Brasil, se aposta mais na macaúba do que na palma-de-óleo, mesmo que esta última seja a principal fonte de óleos vegetais no mundo. Os primeiros Zoneamentos Agrícolas de Risco Climático (ZARCs) apontam condições favoráveis ao desenvolvimento da macaúba em praticamente todo o território nacional. Ficam de fora uma área do Nordeste, por indisponibilidade hídrica, e outra no Sul, por baixas temperaturas. Esse é o cenário para três espécies de ocorrência natural da palmeira. A tendência é de que o quadro fique ainda mais favorável com o melhoramento genético. A referência da palma-de-óleo é alerta também para a nascente cadeia da macaúba no Brasil estar atenta às questões de sustentabilidade da produção. A palma-de-óleo ficou associada a problemas ambientais, nos países asiáticos que lideram o mercado. A orientação, por aqui, é estabelecer plantios apenas em áreas já abertas, como as de pastagens degradadas, e agregar outras características sustentáveis, como a produção em sistemas integrados. O gerente de Pesquisa e Desenvolvimento de Produtos Renováveis da Petrobrás, Andre Bello de Oliveira, diz que espera disponibilidade de óleo de macaúba, no médio prazo, para produção de biocombustíveis. Mas esse óleo precisará ter baixa intensidade de carbono certificada. Incluir quem já vive da macaúba Depois de dois dias de apresentações e debates sobre exigências do mercado internacional, variabilidade genética e processos para obtenção de produtos, a pesquisadora da Embrapa Agroenergia fez um apelo aos congressistas. Ela pede que o desenvolvimento tecnológico não deixe de fora as populações que tradicionalmente já obtêm renda da macaúba. São pessoas que coletam os frutos de maciços naturais e utilizam processos artesanais para obter óleos e farinhas para vender e complementar a renda. “Há um grupo de pessoas que já trabalham com a macaúba e não podem ser negligenciadas. Temos que embarcar essa população nesse novo momento”, defendeu. Na área de estandes do congresso, duas organizações de agricultores para comercializar derivados da macaúba expuseram seus produtos. A Cooper-Riachão, de Montes Claros, MG, tem óleo da polpa do coco macaúba, óleo da amêndoa, sabão em pó, sabão em barra, sabonetes, ração de polpa e torta de amêndoa. Já a Pantanal in Box, tem farinhas, óleos e fez, no local, milk-shake de macaúba, ou melhor, de bocaiúva, como é conhecida a planta no Mato Grosso do Sul. Além do congresso brasileiro, o evento incluiu o I Congresso Internacional de Macaúba, com participantes de países da América Latina e da Alemanha. Contou com mais de 150 trabalhos científicos e reuniu aproximadamente 60 empresas e 280 pessoas, entre elas muitos jovens. Simone Fávaro comemora: “Vemos muitos jovens fazendo pós-graduação e conseguindo empregos em atividades de alta qualificação no mundo da macaúba. Isso é fantástico!” O congresso foi organizado conjuntamente pela Embrapa Agroenergia, IAC, Universidade Federal de Viçosa e Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.
Onze anos separam a primeira da segunda edição do Congresso Brasileiro de Macaúba. À época da primeira, 2013, os pesquisadores precisavam explicar: é uma palmeira nativa do Brasil, encontrada em quase todo o território, tem um fruto com uma polpa amarela ou alaranjada e uma castanha, ambas comestíveis. Tanto a polpa quanto a castanha geram óleos em quantidade semelhante ou superior à da palma-de-óleo, que podem ser usados para fazer muitas coisas, de xampu a combustível de avião.
Na nova edição do evento científico, realizado na semana passada, em Campinas, SP, o auditório do Instituto Agronômico (IAC) ficou lotado de pessoas para as quais já não era preciso explicar nada disso. De estudantes a empresários, o público já conhecia a planta e seu potencial. Buscava ali os avanços das pesquisas para a exploração comercial e oportunidades de negócios. “Há 11 anos, tínhamos que mostrar uma foto, falar com detalhes. Hoje, não. Hoje, o nome macaúba já abre portas”, diz a pesquisadora Simone Palma Favaro, da Embrapa Agroenergia, uma das organizadoras do congresso.
Nesse período, o número de artigos científicos sobre a cultura foi multiplicado por quatro. Também cresceram os depósitos de patentes de tecnologias relacionadas à cultura – e eles se concentram no Brasil. O coordenador do Congresso, o pesquisador do IAC Carlos Augusto Colombo, avalia que as instituições públicas de pesquisa foram as primeiras a acreditar na macaúba. Com os resultados do trabalho delas, o setor privado começou a se interessar. Em sintonia com o colega, Simone Favaro lembra que, quando aconteceu o primeiro congresso, havia apenas duas empresas começando a investir na cultura, mas ainda sem nenhum plantio comercial. Hoje, são quatro companhias e as plantações estão chegando a 10 mil hectares.
Óleo para a Bioeconomia
Além dos resultados alcançados pelas pesquisas, o estímulo vem do mercado, particularmente dos compromissos firmados por nações e segmentos econômicos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Renato Roscoe, diretor do Instituto Taquari Vivo, destacou: “198 países concordam que as mudanças climáticas estão aí e algo precisa ser feito”. Diminuir o lançamento de GEEs na atmosfera é uma das principais metas, o que pressiona principalmente o setor de energia. Ele é responsável por 73% das emissões globais e a demanda só cresce. Substituir fontes fósseis por matérias-primas renováveis é uma das principais estratégias e é aí que entra a macaúba, com sua alta produtividade de óleos e biomassa.
Entre uma infinidade de produtos, há expectativa de que o óleo de macaúba sirva de insumo para a produção de combustível sustentável de aviação, cuja demanda está estimada em 450 bilhões de litros em 2050. Diferente do que ocorre nos automóveis, não há previsão de eletrificação dos aviões, que continuarão utilizando combustíveis líquidos, assim como os navios.
O pesquisador Maurício Antônio Lopes, da Embrapa Agroenergia, ressalta que a descarbonização, com o uso de matérias-primas renováveis, é meta também de vários outros segmentos industriais, como o da química e o de materiais. Com isso, a demanda por óleos, já crescente e com reflexo nos preços, deve aumentar. “Óleos vegetais vão se tornar elemento crítico nessa nova economia que está surgindo”, analisa. Para Lopes, “a macaúba poderá se tornar uma nova soja no Brasil”.
Cenário promissor
A palmeira está em processo de domesticação: ainda não há variedades que passaram por melhoramento genético e, apesar dos avanços, seguem em aberto questões como o ponto e forma de colheita. Mas, com três mapas na tela, Lopes mostra que, nos anos 1960, o cultivo de soja estava praticamente restrito a uma pequena mancha no Sul do País; com o desenvolvimento tecnológico, em 1999, já estava presente nas cinco regiões e, hoje, responde por pelo menos 25% do valor bruto da produção agropecuária nacional.
Também com três mapas, Simone Favaro mostra uma das razões pelas quais, no Brasil, se aposta mais na macaúba do que na palma-de-óleo, mesmo que esta última seja a principal fonte de óleos vegetais no mundo. Os primeiros Zoneamentos Agrícolas de Risco Climático (ZARCs) apontam condições favoráveis ao desenvolvimento da macaúba em praticamente todo o território nacional. Ficam de fora uma área do Nordeste, por indisponibilidade hídrica, e outra no Sul, por baixas temperaturas. Esse é o cenário para três espécies de ocorrência natural da palmeira. A tendência é de que o quadro fique ainda mais favorável com o melhoramento genético.
A referência da palma-de-óleo é alerta também para a nascente cadeia da macaúba no Brasil estar atenta às questões de sustentabilidade da produção. A palma-de-óleo ficou associada a problemas ambientais, nos países asiáticos que lideram o mercado. A orientação, por aqui, é estabelecer plantios apenas em áreas já abertas, como as de pastagens degradadas, e agregar outras características sustentáveis, como a produção em sistemas integrados. O gerente de Pesquisa e Desenvolvimento de Produtos Renováveis da Petrobrás, Andre Bello de Oliveira, diz que espera disponibilidade de óleo de macaúba, no médio prazo, para produção de biocombustíveis. Mas esse óleo precisará ter baixa intensidade de carbono certificada.
Incluir quem já vive da macaúba
Depois de dois dias de apresentações e debates sobre exigências do mercado internacional, variabilidade genética e processos para obtenção de produtos, a pesquisadora da Embrapa Agroenergia fez um apelo aos congressistas. Ela pede que o desenvolvimento tecnológico não deixe de fora as populações que tradicionalmente já obtêm renda da macaúba. São pessoas que coletam os frutos de maciços naturais e utilizam processos artesanais para obter óleos e farinhas para vender e complementar a renda. “Há um grupo de pessoas que já trabalham com a macaúba e não podem ser negligenciadas. Temos que embarcar essa população nesse novo momento”, defendeu.
Na área de estandes do congresso, duas organizações de agricultores para comercializar derivados da macaúba expuseram seus produtos. A Cooper-Riachão, de Montes Claros, MG, tem óleo da polpa do coco macaúba, óleo da amêndoa, sabão em pó, sabão em barra, sabonetes, ração de polpa e torta de amêndoa. Já a Pantanal in Box, tem farinhas, óleos e fez, no local, milk-shake de macaúba, ou melhor, de bocaiúva, como é conhecida a planta no Mato Grosso do Sul.
Além do congresso brasileiro, o evento incluiu o I Congresso Internacional de Macaúba, com participantes de países da América Latina e da Alemanha. Contou com mais de 150 trabalhos científicos e reuniu aproximadamente 60 empresas e 280 pessoas, entre elas muitos jovens. Simone Fávaro comemora: “Vemos muitos jovens fazendo pós-graduação e conseguindo empregos em atividades de alta qualificação no mundo da macaúba. Isso é fantástico!”
O congresso foi organizado conjuntamente pela Embrapa Agroenergia, IAC, Universidade Federal de Viçosa e Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.
Vivian Chies (MTb 42.643/SP)
Embrapa Territorial
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