O pesquisador Roberto Teixeira Alves, da Embrapa Cerrados (DF), apresentou no dia 17 de maio, durante a AgroBrasília 2018, a palestra “Controle Biológico de Pragas”. A apresentação foi acompanhada por técnicos, produtores, pesquisadores e estudantes no auditório Brasília do Parque Tecnológico Ivaldo Cenci, onde a feira foi realizada de 15 a 19 de maio. A palestra foi promovida pela Embrapa e pela Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação.
Alves iniciou a palestra explicando o motivo do surgimento dos insetos-praga. Nos ambientes intocados de vegetação nativa, as populações de insetos estão em equilíbrio. Mas quando se desmata e se cultiva outra espécie de planta nessas áreas, as barreiras naturais são eliminadas, aumentando a oferta de alimentos para aqueles insetos que preferem a nova espécie de planta. Em consequência, a população de um ou mais insetos aumenta, causando prejuízos econômicos – esses serão os insetos-praga.
A paisagem agrícola brasileira, com grandes extensões de lavouras de diversas culturas e seus diferentes ciclos, serve de alimento para os insetos-praga, que terão mais tempo para se multiplicarem. Segundo apontou o pesquisador, o problema é agravado pelo uso inadequado dos agrotóxicos, caracterizado pela não utilização do Manejo Integrado de Pragas (MIP); a calendarização da aplicação de inseticidas; dosagens inadequadas de inseticidas, “coquetéis”, inseticidas não seletivos para inimigos naturais e o uso de mesmos grupos químicos e modo de ação, fatores que levam à indução de resistência dos insetos-praga aos produtos.
O pesquisador citou e exemplificou os diversos métodos de controles de pragas, tais como os legislativos, mecânicos, culturais, físico, plantas resistentes, comportamental, químico e de controle biológico. “Não existe uma planta imune a tudo nem um método melhor que o outro. O certo é conscientizar para a realização do MIP, e para isso é preciso saber como utilizar cada tipo de controle individualmente”, explicou Alves.
Assim como uma casa, o MIP é constituído por bases e pilares. As bases são a taxonomia, a biologia e a ecologia dos insetos-praga; o monitoramento constante e eficiente da praga em todas as culturas do sistema para a tomada de decisão sobre o controle a ser adotado; o nível de controle, que antecede o nível de dano; e as condições do agroecossistema. Já os pilares são os métodos de controle disponíveis – cultural, biológico, comportamental, genético, varietal e químico. “O MIP visa a eliminar ou minimizar o uso de produtos químicos. Se você conseguir minimizá-lo, vai gastar menos dinheiro”, disse Alves.
O pesquisador apontou diversos motivos pelos quais o controle biológico, um dos pilares do MIP, não é utilizado em grande escala nos diferentes países, principalmente o desconhecimento das práticas. “O agricultor tem que se familiarizar com o controle biológico, os produtos e a forma de aplicação, iniciando em pequenas áreas. Não apenas o dono da fazenda, mas todos os empregados precisam, aos poucos, se convencerem e acreditarem nele”, afirmou.
Alves conceituou o controle biológico como método de controle de pragas por meio de inimigos naturais, que são organismos que mantêm os níveis de população dessas pragas em equilíbrio. O controle biológico representa apenas 2% do mercado nacional de defensivos agrícolas, que movimenta anualmente US$ 9 bilhões.
Ele explicou que o controle biológico é feito por espécies de predadores, parasitas/parasitoides e patógenos, citando exemplos dessas espécies. As espécies predadoras como a joaninha e a Cycloneda sanguinea se alimentam do inseto-praga, não sendo específicos. Os parasitos e os parasitoides como Trichogramma spp. e Trissolcus basalis são mais específicos e, normalmente, necessitam de um hospedeiro para completar o ciclo de desenvolvimento, podendo matá-lo, no caso dos parasitoides.
Já os patógenos são microrganismos causadores de doenças em insetos. Podem ser facultativos (desenvolvem-se no hospedeiro ou em meio de cultura artificial), como o fungo Metarhizium anisopliae e a bactéria Bacillus thuringiensis, ou obrigatórios, como o Baculovirus anticarsia, que só se desenvolvem no inseto.
O pesquisador apontou os três tipos de controle biológico. O controle biológico natural é feito pela população de inimigos naturais que ocorrem naturalmente no ambiente – a Embrapa desenvolveu o aplicativo para smartphones “Guia InNat” para auxiliar na identificação de inimigos naturais de pragas agrícolas. O controle biológico clássico, pouco usado no Brasil, consiste na importação e colonização de parasitoides ou predadores para o controle de pragas exóticas ou nativas.
Já controle biológico aplicado, mais comum dos três, trata de liberações de patógenos, parasitoides ou predadores produzidos em laboratório visando à rápida redução da população da praga para o nível de equilíbrio. Pode ser feito com pulverizadores a drones e as vias de infecção dos fungos é, normalmente, via tegumento, e das bactérias e vírus é via oral.
Alves explicou o modo de ação de produtos a base de fungos, de bactérias e de vírus entomopatogênicos, de insetos parasitoides e de nematoides, citando exemplos como o M. anisopliae, fungo para controle da cigarrinha-da-raiz da cana de açúcar; B. thuringiensis, bactéria para controle de lagartas e pernilongos borrachudos; B. anticarsia, vírus para controle da lagarta da soja; Cotesia flavipes, inseto parasitoide da broca-da-cana-de-açúcar, e Trichogramma spp., inseto parasitoide de ovos de lepidópteros; e o Steinernema puertoricence, nematoide para controle de Sphenophorus levis e Migdolus fryanus em cana-de-açúcar. O pesquisador mostrou as listas dos produtos que estão registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
O uso de micoinseticidas no controle biológico de pragas no Brasil alcança área equivalente a 2 milhões de hectares anuais, extensão que deverá dobrar nos próximos três anos. Alves destacou o trabalho em que avaliou diferentes formulações de um micoinseticida com o fungo M. anisopliae para o controle da cigarrinha-da-raiz da cana de açúcar. O fungo também é usado em micoinseticidas para controle da cigarrinha-das-pastagens dos gêneros Deois, Notozulia e Mahanarva.
O pesquisador citou outras espécies de fungos que controlam insetos-praga, como Metarhizium acridium para controle de gafanhotos; Nomuraea rileyi, que controla a lagarta da soja (Anticarsia gemmatalis); Sporothrix insectorum para controle do percevejo-de-renda da seringueira (Leptopharsa heveae); Beauveria bassiana, usada no controle do moleque-da-bananeira (Cosmopolites sordidus); e Trichoderma spp., utilizado no controle de fungos causadores de doenças no solo.
A aplicação dos micoinseticidas pode ser feita via terrestre, por meio de pulverizadores costais manuais ou motorizados, trator equipado com atomizador ou barra pulverizadora; ou via aérea, com avião ou helicóptero equipado com barra pulverizadora (formulação a base de água) ou avião equipado com o aplicador de sólidos “Swathmaster” (formulação granulada). De acordo com estudos do pesquisador, o ideal para que o micoinseticida surta efeito é que a aplicação garanta a deposição de 20 a 30 gotas/cm² no alvo.
Alves criticou a produção caseira de biodefensivos, apontando os riscos para as lavouras e as pessoas. Ele citou estudo da Embrapa que identificou, em fazendas que produzem os próprios biodefensivos para reduzir custos, coliformes fecais e as bactérias Enterococcus gallinarum e E. casseliflavus, que podem provocar endocardite em animais. “É preciso ter assepsia, esterilização para produzir sem contaminação. O barato sai caro”, disse.
O pesquisador encerrou a palestra comentando que cada participante deve colaborar na difusão de informações técnicas sobre o controle biológico para que o uso adequado do método seja aumentado, o que evitará resíduos químicos nos alimentos, a contaminação dos recursos naturais e intoxicações dos trabalhadores rurais.